domingo, 11 de dezembro de 2011

Enfim, Tiririca revela esconderijo

Arte: Elizeu Lima 


Tiririca

DARWIN VALENTE
Mais de um ano após as últimas eleições, foi finalmente revelado o segredo que movimentou, durante semanas, os veículos de comunicação de todo o País. Afinal, aonde teria se metido Francisco Everardo Oliveira Silva, o palhaço Tiririca, após arrancar das urnas surpreendentes 1.348.295 votos, algo equivalente a 6,35% dos votos válidos para deputado federal, em outubro de 2010?


Enquanto a Imprensa tentava, sem sucesso, encontrar o fenômeno das urnas, àquela altura sob acusação de ser analfabeto e, por isso mesmo, ter fraudado um documento da Justiça Eleitoral, Tiririca, descansava tranquilamente num sítio localizado no Bairro do Maracatu, na zona rural de Guararema, próximo à Rodovia Ayrton Senna, para onde foi levado por determinação de seu companheiro de partido e responsável direto por sua candidatura, o deputado federal Valdemar Costa Neto, do PR.


No sítio, de propriedade de Eduardo Ferrari, cunhado do deputado estadual André do Prado, à época também recém-eleito pelo PR, Tiririca ficou ao lado da mulher Nana Magalhães e de uma filha, praticamente isolado do resto do País, por quase 30 dias, tempo suficiente para que os advogados de seu partido cuidassem de sua defesa diante das acusações de analfabetismo que pipocavam de todos os cantos, em todos os órgãos de imprensa, e que poderiam aniquilar de vez com os sonhos do antigo artista de circo, nascido em 1º de maio de 1965, em Itapipoca, no Ceará, de chegar à Câmara Federal como o deputado mais votado de todo o País.


"Naqueles dias eu estava estressado", lembrou Tiririca, na última quinta-feira, ao assumir, pela primeira vez, o comando de uma audiência pública na Câmara, justamente para tratar de questões ligadas ao funcionamento dos circos em todo o País. Foi quando ele revelou, pela primeira vez, que havia se isolado em Guararema após a apuração das eleições passadas.


E para curar tanto estresse, nada como boas conversas e até algumas partidas de futebol, jogadas com familiares de André do Prado e algumas poucas pessoas do PR, como o secretário regional José Renato, que faziam questão de visitá-lo praticamente todos os dias para lhe dar apoio e ajudar o tempo passar.


"Foram 30 dias de muitas histórias e piadas, que ele gostava de contar. Tiririca tem uma história de vida muito bonita. E muitas coisas para relatar, como o caso do circo que ele tinha lá no Ceará e que um dia pegou fogo", lembra o deputado André do Prado, ao falar publicamente, pela primeira vez, sobre o assunto.


A pedido de Costa Neto, o sítio de final de semana do cunhado de André se transformou no esconderijo ideal para Tiririca, que lá chegou à noite e não mais saiu, até que seus problemas fossem todos devidamente encaminhados.


Sua esposa, entretanto, costumava ir até um mercadinho das proximidades para fazer comprar e trazer notícias. Certo dia, ela foi até lá e ouviu pessoas comentando que o Tiririca estaria em Fortaleza, próximo de sua família. Nana fez de conta que não se interessou pelo assunto, mas prestou atenção quando o locutor da Globo informou que todos estavam à procura de seu marido. Ela sorriu, discreta, pois só ela sabia que o personagem tão procurado estava a alguns metros dali.


Nas conversas com os amigos que o visitavam, além de histórias pessoais e piadas, muitas piadas, Tiririca também dizia que jamais acreditava que pudesse ultrapassar um milhão de votos. Esperava, no máximo, uns 5 mil. E admitia: "O único que acreditava era o Valdemar", dizia, referindo-se ao criador da versão moderna do "Cacareco" e do Doutor Enéas.


Não era só Valdemar que confiava nele. O pessoal do PR começou a sentir o fenômeno quando, a certa altura da campanha, a simples presença de Tiririca era capaz de "parar qualquer cidade", onde ele se apresentasse com o ônibus especialmente programado para o candidato viajar ao lado das "tiririquinhas", um grupo de crianças que, vestidas a caráter, acompanhavam o palhaço em suas andanças.


Tiririca não arriscou a vir a Mogi, mas passou perto. Foi até Arujá, onde o prefeito Abel Larini, também do PR, testemunhou o fenômeno, cuja popularidade era impulsionada pelos programas de televisão onde ele aparecia recitando alguns bordões provocativos:


"O que é que faz um deputado federal? Na realidade, eu não sei. Mas vote em mim que eu te conto", ou "Pior do que tá não fica, vote Tiririca". Menções que lhe custaram uma representação junto à Justiça Eleitoral, sob alegação de estar afrontando o Congresso Nacional. Os juízes arquivaram a denúncia.


"Só eu, a minha família e umas dez pessoas sabíamos da presença do Tiririca em Guararema, mas tínhamos um pacto de silêncio que não foi quebrado", lembra o deputado André do Prado, que se recorda de um Tiririca "a princípio assustado", mas que logo se enturmou com todos. "Tratamos de tirar a ansiedade dele, pois tudo era novo para ele, mas afinal deu tudo certo", diz André, que desconversa, quando perguntado se durante o período em que o visitante esteve em Guararema, recebeu a visita de alguma professora para ajudá-lo a desenvolver melhor a caligrafia e leitura, ainda hoje deficientes.


André prefere se lembrar dos churrascos, onde Tiririca cantava a sua "Florentina" e outros números musicais bem humorados, em meio a piadas. "Ele era muito divertido, peça rara, gente muito boa", atesta André, que também não confirma a notícia que correu a região à época, dando conta de que o palhaço e Costa Neto haviam visitado, a bordo de um helicóptero, o Paradise Golf & Lake Resort, em Jundiapeba, para um almoço.


O deputado estadual disse que não teve conhecimento disso e que Valdemar Costa Neto também não foi visitar seu pupilo no esconderijo "para não levantar suspeitas".


Também garante que nem Tiririca e nem o PR pagaram um só tostão pela hospedagem do deputado federal e sua família ao cunhado Ferrari.


"Só o fato de ter recebido o Tiririca em sua casa, foi uma honra para ele", afirma André, que ainda guarda em seu celular uma foto tirada após uma das muitas peladas disputadas no campinho de futebol do sítio. O visitante, lembra o deputado estadual, adorava jogar bola. "E jogava bem", completa.


Um ano após todos esses episódios, André se diverte muito ao relembrar o período de "reclusão" do deputado mais votado do Brasil e diz que tem a esperança de que Tiririca cumpra o que prometeu, ao deixar Guararema, semanas antes de sua posse no Congresso Nacional:


"Ele garantiu que irá voltar para fazer um grande churrasco e bater uma bola com os amigos que deixou por lá. Todos os seus antigos companheiros estão esperando", garante. O "Abestado" vai voltar.


Fonte:O Diário de Mogi