quinta-feira, 3 de setembro de 2020

 Entrevista com Marcus Melo: queda na receita e combate à Covid-19

20 horas atrás8 min. - Tempo de leitura

Carla Olivo

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Marcus Melo diz que a cidade acertou na estrutura de combate ao coronavírus, mas os equipamentos conquistados, como respiradores para leitos de UTI, terão de ser reavaliados para compor o sistema hospitalar (foto: Eisner Soares)

Com a diminuição de cerca de R$ 100 milhões na arrecadação de Mogi das Cruzes neste ano, a Prefeitura Municipal espera manter o equilíbrio das finanças nos últimos meses de 2020 por conta de legislações do Governo Federal que permitiram postergar pagamentos de contribuições previdenciárias e de financiamentos junto a órgãos oficiais. A afirmação é do prefeito e pré-candidato à reeleição Marcus Melo (PSDB), que prevê maiores dificuldades em 2021, quando, segundo ele, não há indícios de apoio da União aos municípios. O chefe do Executivo também enfatiza que a queda no orçamento dificulta a criação, ampliação e manutenção dos serviços. Em um balanço sobre o trabalho para enfrentamento da pandemia do novo coronavírus (Covid-19) até o momento, Melo avalia que a cidade faz o caminho certo, implantou o Hospital de Campanha, ampliou leitos de UTI, investiu em medicamentos e equipamentos de segurança para os profissionais e criou protocolos únicos entre poder público e a iniciativa privada. Mas ainda não há definição sobre a volta às aulas presenciais. Confira a entrevista a O Diário:

De que maneira a pandemia da Covid-19 afetou a administração, principalmente o orçamento?

Temos uma redução da receita da ordem de quase R$ 100 milhões. Todos os recursos que a Prefeitura recebe são para reinvestir em benefício da população em serviços, atividades, manutenção, reformas, melhorias, e essa redução acaba inibindo o início de novos serviços, a ampliação e mesmo a manutenção das atividades. Houve uma recomposição por parte do Governo Federal e algumas legislações permitiram à Prefeitura postergar os pagamentos, como o Instituto de Previdência, e também os financiamentos junto aos órgãos oficiais. Então, neste ano, vamos conseguir equilibrar as contas por causa destes ajustes, mas no ano que vem não há nenhum indício do que haverá de apoio aos municípios. Entendo que até o final deste ano, as coisas vão permanecer sem grandes dificuldades. Mas para retornarmos à normalidade, dependemos ainda da solução de uma vacina, que esperamos que seja o mais rápido possível.

Qual é o balanço do trabalho contra a pandemia em Mogi até o momento?

Este é o maior desafio das nossas vidas, enfrentado com muita transparência. As tomadas de decisões foram feitas para salvar vidas. Mogi fez o caminho certo, colocou um hospital de campanha, ampliou os leitos de UTI, investiu em equipamentos de segurança para os profissionais, aquisição de medicamentos e criou protocolos únicos entre poder público e a iniciativa privada. Foi a primeira vez que houve um grande encontro entre o público e o privado, então, teve uma forte união que proporcionou salvar muitas vidas. Entendo que logo no primeiro momento, nós enfrentamos o problema, não corremos da reta como muita gente correu e nem ficamos assistindo. Fomos resolutivos, conseguimos resolver as necessidades que tínhamos naquele momento e preparamos a cidade para este enfrentamento.

Como a cidade se prepara para a possível volta das aulas presenciais? Isso deve ocorrer este ano?

Não consigo responder isso neste momento. Vamos ter algumas reuniões nos próximos dias entre escolas municipais, os diretores que representam os alunos, os pais de estudantes, junto com as escolas estaduais, professores, alunos, e também as particulares. Cada uma tem sua realidade e necessidade e entendo que temos que respeitar as pessoas, os professores, as mães, mas qualquer retomada agora ou em qualquer momento tem que ser segura para todos. A palavra que vem em primeiro lugar é a saúde das pessoas e isso mais do que nunca dentro das escolas.

E a expectativa de Mogi para a chegada à fase verde do Plano São Paulo?

Com um pouco mais de tempo, entendo que estamos aprendendo, embora ainda fique a preocupação com uma segunda onda, como se percebe em alguns países da Europa, onde é grande o número de confirmações nos jovens. Nós, brasileiros, e os mogianos também, aprendemos a conviver com a doença, o uso de máscara, distanciamento e higienização. Muitas empresas estão retomando as atividades com todos os protocolos e o que é muito importante e precisamos todos trabalhar juntos é a retomada dos empregos e de algumas atividades que ainda estão interrompidas.

Quais os momentos mais difíceis e os principais desafios contra a Covid-19 na cidade?

Logo no início, por conta da incerteza do que vinha pela frente, foi muito difícil. Fizemos uma análise conservadora de que o número de óbitos, proporcional ao de idosos na cidade e à população, seria da ordem de 180 a 1,8 mil mortes. Então, se preparar para aquilo que não tínhamos conhecimento foi muito complicado. Montamos um hospital de campanha com capacidade para atender 200 pessoas, mas no início da pandemia não tínhamos resposta se iríamos usar os 200 leitos ou precisaríamos de 400 ou 600. Houve a questão dos jazigos que foram construídos porque vimos no mundo afora caixões na rua e ficamos preocupados com as mortes que ocorreriam na cidade, como de fato estamos hoje com mais de 300 óbitos. Em Manaus, foram abertas valas comuns para enterrar as pessoas. E não estamos tratando de números, mas sim da vida de pessoas, de pais, mães, irmãos. Então, o maior desafio mesmo foi no início, sem saber o que vinha pela frente, e quando aconteceu uma falta de unidade do ponto de vista do Governo Federal de ter uma diretriz. Então, cada cidade, prefeito e gestor foi tomando suas decisões de acordo com as orientações de seus técnicos. Aqui tivemos, desde o primeiro momento, a orientação de profissionais de saúde especialistas, como o atual secretário de Saúde, Jean Gorinchteyn, que me acompanhou quando tive o coronavírus, e o Dr. Henrique Naufel, que tinha acabado de assumir como secretário e nos deu todas as diretrizes e orientações corretas.

Após a pandemia, como a cidade deve ficar em número de leitos de UTI?

A questão dos leitos de UTI depende da realidade dos hospitais. O Hospital Municipal foi construído para ter quartos de enfermaria e 10 leitos de UTI dentro do que é sua função. São realizadas cirurgias e no pós-cirúrgico algumas pessoas precisam ser encaminhadas para a UTI. A situação dos leitos de UTI será uma análise da própria equipe técnica. Conseguimos respiradores, mas estes leitos são de UTI Covid, que é muito diferente de um leito de UTI hospitalar, isso também no Luzia e nos hospitais privados. Os equipamentos que vieram e que conseguimos, inclusive de doações, ficarão para ajudar, mas os leitos de UTI não só em Mogi, mas no Brasil todo serão reavaliados.

Como foi a experiência do senhor e da família com a Covid?

No começo, fiquei muito preocupado com minha vida, a da esposa e dos filhos. A pergunta era por que comigo vai ser tranquilo se não foi para outras pessoas? Percebo pessoas com a mesma faixa etária minha e até mais novas que perderam a vida. Foi muito preocupante, mas graças a Deus passamos bem e, no nosso caso, conseguimos vencer esta doença em casa.

De que forma o senhor vê as recentes investigações do Gaeco sobre contratos feitos pela Prefeitura durante a pandemia?

O Tribunal de Contas fez uma análise de aquisições em todo o Estado de São Paulo e não conseguiu se atentar exatamente à questão do momento da pandemia. No caso específico do álcool em gel e de máscaras, a iniciativa privada que fornece estes produtos para as empresas, não só do setor público, mas também privadas, subiram muito o preço. Quando o Tribunal de Contas fez a análise de preços, três meses depois, as coisas já estavam normalizadas. No caso das máscaras, quem foi lesada foi a Prefeitura, tanto é que entrei com ação pedindo a devolução dos valores e as máscaras estão à disposição da empresa até hoje. Quem faz uma compra tem direito de arrependimento em 7 dias para devolver o produto e pegar o dinheiro de volta. Identificamos que o valor estava muito alto e solicitei à Procuradoria que entrasse com ação para devolver 5 mil máscaras N95, compradas a R$ 80,00 cada, e receber este dinheiro. Este processo está na Justiça e pedi ao Ministério Público que auxilie o município, porque quem foi lesado foi a Prefeitura, que pagou um valor muito alto que a empresa e o mercado ofereciam naquele momento, por isso pedi a devolução. Faltou naquele momento uma gestão do Governo Federal para normatizar e inibir os abusos que estes empresários cometeram. Mas se naquele momento tivéssemos que adquirir máscara para salvar vidas, teríamos feito isso de qualquer maneira. Tínhamos, em média, no início do ano, o uso de 2 mil máscaras por mês e, da noite para o dia, passamos a ter a necessidade de 20 mil a 30 mil máscaras por semana. O mercado no mundo não estava preparado para isso e houve aumento de valores no mundo inteiro.

E a questão da construção de sepulturas, também investigada?

Os jazigos foram uma preocupação porque a cidade já tem um problema antigo da falta de locais nos cemitérios. Isso não é um problema de hoje e houve a preocupação, em março, com o desafio da possibilidade de se ter 1,8 mil óbitos. Tivemos que tomar a decisão de construir locais para que estes mogianos pudessem enterrar seus entes queridos. A Prefeitura fez a contratação de acordo com a legislação existente, o serviço foi entregue e está sendo utilizado. É uma obra de engenharia, com referências oficiais, que foi feita pelos próprios colaboradores da Prefeitura.

Fonte:O Diário de Mogi