sábado, 30 de julho de 2011

Relatório do voo 447 reduz culpa de pilotos

PARIS
O novo relatório do Escritório de Investigações e Análises para a Aviação Civil (BEA), órgão francês que apura o voo AF-447, prometia explicar as "circunstâncias exatas" do acidente, mas o que entregou foram novas dúvidas.


O documento, de mais de 120 páginas, volta a confirmar a falha inicial nos sensores eletrônicos de velocidade e completa: a tripulação do Airbus A330-300 errou ao ordenar que o avião ganhasse altitude excessiva, causando a queda três minutos depois. Mas um ponto é crucial: os investigadores não sabem por que os pilotos tomaram tal decisão.


As novas revelações do BEA confirmam a complexidade do acidente do AF-447, causado - como de praxe na aviação civil - por múltiplos fatores. Em seu documento, o escritório afirma, sem citar nomes, que o copiloto Pierre-Cedric Bonin, de 32 anos, então com o comando da aeronave, ao receber a indicação de "erro da velocidade aferida", fruto da pane dos sensores, assumiu o controle manual da aeronave. Às 2h10min16s da madrugada de 1º de junho de 2009, ele passou a elevar a altitude do avião acima do limite recomendável, cinco graus.


Esse procedimento é exagerado, mas Bonin o manteve até instantes antes da queda. "A incidência registrada, de cerca de 6 graus no disparo do alarme de perda de sustentação, continua a aumentar. O estabilizador horizontal regulável passou de três graus para 13 graus ao levantar o nariz durante um minuto", diz o documento.


O relatório completa: "Em menos de um minuto após o desligamento do piloto automático, o avião saiu de seu domínio de voo em razão das ações de pilotagem manual, majoritariamente para ganhar altitude".


Às 2h10min51s, por perder rapidamente velocidade, o avião já estava em queda, com o bico inclinado para cima. Segundo o BEA, durante o incidente, o alarme de perda de sustentação disparou, mas se apagou, antes de voltar a disparar - em um comportamento errático. Além disso, nada indica que os pilotos haviam compreendido a perda de altitude, nem a perda de sustentação. "A incidência do avião não é apresentada diretamente aos pilotos", diz o texto.


O resultado é que o avião aprofundou sua queda, mas os dois copilotos, Bonin e David Robert, de 37 anos, não entenderam o que estava acontecendo. Às 2h11min45s, um minuto e 30 segundos após a desativação do piloto automático, o comandante do voo - então em período de descanso - ingressou na cabine, mas não pôde fazer nada para recuperar o controle do avião.


As evidências apresentadas pelo BEA confirmam que as decisões tomadas pelo copiloto em função foram determinantes para a queda. Mas ele não é conclusivo sobre por que Bonin tomou tais decisões, se o procedimento para evitar a perda de sustentação - inclinar o nariz do avião para baixo - é banal e ensinado nas escolas de aviação.


A questão continua em aberto porque as caixas-pretas não registraram as informações disponíveis nas telas de David Robert, o que poderiam explicar o comando para ganhar altitude. "Não se conhece as razões pelas quais o piloto em função empinou a aeronave", respondeu ao Grupo Estado Alain Bouillard.


O investigador-chefe ainda completou: "Se foi falha humana ou se foi algo que foi apresentado aos pilotos, ou se houve elementos exteriores ou outra coisa que contribuiu para uma representação errada da situação, a investigação vai dizer".


Sem poder contar com as caixas-pretas para obter tais informações, os técnicos do BEA anunciaram a criação de um grupo de trabalho "Fatores Humanos" para estudar o comportamento dos pilotos, e planejam ainda explorar os "calculadores" do avião, o sistema eletrônico que foi retirado do mar nas operações de busca.


Sobre a possível falha humana, Gérard Feldzer, ex-piloto de A330-300, ex-diretor do Museu Aeronáutico da França e um dos consultores mais respeitados do país, disse ao Grupo Estado que "os pilotos aplicaram o procedimento, mas o fizeram em excesso".


Fonte:O Diário de Mogi