terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Histórias de vida da região serrana do RJ comovem até voluntários acostumados com catástrofes

As histórias de vida das vítimas da tragédia na região serrana do Rio de Janeiro abalam até mesmo voluntários acostumados a prestar solidariedade em momentos de catástrofe. “São histórias de vida muito difíceis”, disse ao UOL Notícias Sílvio Maffei, dentista que trabalha pela organização não governamental Viva Rio em postos do Programa Saúde da Família. Ele esteve nos últimos três dias dando assistência de saúde a moradores das áreas mais atingidas pela enxurrada em Nova Friburgo.

Desde domingo (16), as equipes de saúde da Viva Rio estão visitando áreas onde a Secretaria Municipal de Saúde de Friburgo ainda não conseguiu chegar para distribuir vacinas e kits básicos de atendimento para a população.
Muitas vezes, "a oferta de um abraço já dá um efeito de consolo", explica. Sílvio tem atuado diretamente com a população mais necessitada e argumenta que faltam ainda informações das áreas que precisam de ajuda.
Morador mostra a destruição provocada por água, pedra e lama na região serrana.
“É preciso agilizar os grupos de assistência e a distribuição de kits de primeiros socorros. Faltam mapeamentos de áreas que têm necessidade de se alcançar. A saúde é importante nesse momento, precisaríamos de um centro de coordenação interligado”, afirma Sílvio, ao ressaltar que falta ainda um comando estratégico para a saúde.
“Não há nenhuma pessoa na cidade que não tenha perdido alguém, algum conhecido”, disse a arquiteta Flávia Maffei, de 30 anos. Ela e seu esposo, Sílvio Maffei, estão mobilizados na causa de Friburgo. Ela foi à cidade como funcionária do Instituto de Terras e Cartografia do Estado (Iterj) e ele, como voluntário.
“Quando começa a chover as pessoas entram em pânico”, comentou Flávia. Ao longo do dia, a temperatura beira os 30 ºC, e no final da tarde o tempo fecha e ameaça chover.


Sem área segura

“Hoje em Friburgo não tem área segura, Friburgo toda é área de risco”, disse o pastor evangélico Sérgio Paulo Garcia Paim, de 45 anos, que abriu as portas de sua igreja para acolher donativos que chegavam do Viva Rio e do Rotary. Ele foi um dos voluntários que colocou à disposição seu próprio carro para levar medicamentos a localidades de difícil acesso, onde os feridos precisavam de tratamento.
Só no bairro Alto do Floresta, onde a situação, segundo Paim, é uma “das mais complicadas”, cerca de 30 pessoas morreram. A Defesa Civil e os Bombeiros ainda demoram para chegar, relata. O bairro de baixa renda é bastante populoso e tem um dos maiores barrancos que caiu e levou cerca de 40 casas na madrugada do dia 12 de janeiro. Lá, a escola municipal Ernesto Tessarolo serve de abrigo e de refeitório para muitas vítimas.
“Ficou um abismo de 100 metros. A quantidade de lixo é impressionante. O que aconteceu aqui foi uma coisa absurda”, disse. Sérgio. No Alto do Floresta ainda há muitos rastros da grande enxurrada. Ao caminhar pelas ruas estreitas do bairro localizado em cima de morros, é possível ver pequenos deslizamentos que atingiram casas. Os bombeiros conseguiram alcançar o Alto do Floresta faz pouco tempo, explica Sérgio, “mas não fizeram resgates pelas possibilidades mínimas de ter vida”.
Ao final da tarde desta segunda-feira (17), quando já começava a escurecer, por volta das18h, o tempo fechou e ameaçou chover. A tensão aumentou entre os moradores. O risco de haver mais uma tempestade e cair mais barrancos assusta. “Meu Deus, segure essa chuva e deixe que isso não caia”, rezava o pastor.
Moradora há 30 anos do Alto do Floresta, Rosa Lemos, disse que as pessoas ainda estão em estado de choque. “Estamos abrigando 80 pessoas aqui na escola municipal e também ajudando aos que vêm para pedir comida. Aqui 32 pessoas morreram, resgatamos todos os corpos e ainda deu para salvar oito vidas”, conta Rosa.
Ela disse que foram os próprios moradores que salvaram. “Não tivemos ajuda de Bombeiros. Os heróis aqui foram os moradores, que, descalços, tiravam os corpos com enxada. Todos os corpos aqui foram identificados pelos familiares e sepultados com dignidade”, relata Rosa, que está coordenando a ajuda na escola municipal.

Fabíola Ortiz
Especial para o UOL Notícias
No Rio de Janeiro